29 julho 2025

Enio Lins opina

As almas sebosas dos Quislings baixaram em traidores do mesmo quilat
Enio Lins  

CELSO DE MELLO  é professor, jurista, ministro aposentado do STF, decano daquele corte de 2007 a 2020, e seu presidente entre 1997 e 1999. No dia 21 deste, escreveu uma carta aberta ao Supremo Tribunal Federal. Texto notável.

QUEM SE LEMBRA  do termo “Quisling”? Assim como “Quinta-coluna”, faz parte dos vocabulários criados na II Grande Guerra Mundial. Significa “traidor da pátria”, e/ou “traíra” – como a gíria brasileira rotula quem atraiçoa.  Vidkun Quisling  (1887/1945) tornou-se exemplo de vilania quando aceitou ser governante-marionete dos nazistas na Noruega. Ao final da guerra, foi julgado e fuzilado por alta traição. Celso de Mello, em boa hora, traz o fundo da botija da cultura o conceito, colocando-o como carapaça perfeita sobre os quengos da lesa-pátria que, no colo de Trump, oferece a soberania brasileira com desfaçatez e canalhice tais que envergonharia até o finado Vidkun.

“MAIS DO QUE UMA OFENSA  sem causa, essa prepotente deliberação governamental americana, fundamentada em fundamento destituído de veracidade (mendaz, portanto), ao investir, absurdamente, contra o Supremo Tribunal Federal e os seus íntegros e honrados magistrados, desrespeita, profundamente, o nosso País e a dignidade do povo brasileiro!”, escreveu Celso de Mello, e foi além: “Mais do que uma ofensa causa sem, essa prepotente deliberação governamental americana, fundamentada em fundamento de constituído de veracidade (mendaz, portanto), ao investir, absurdamente, contra o Supremo Tribunal Federal e os seus íntegros e honrados magistrados, desrespeita, profundamente, o nosso País e a dignidade do povo brasileiro!”.

“MAIS DO QUE NUNCA , e em razão de recentes acontecimentos, entre os quais, a ocorrência da revogação de vistos, torna-se necessário identificar expor e punir, nos termos da lei e respeitado o direito ao 'due process of law', os 'quislings' nacionais que, ressentidos, despojados de qualquer dignidade e destituídos de qualquer sentimento patriótico de respeito e apreço por nosso país, agem, insidiosa ou especificamente, contra os interesses do Brasil e do seu povo, conspirando, sem pudor e de modo desonroso aqui ou em terras estrangeiras, com o sórdido (e traiçoeiro) objetivo de submeter nossa pátria, os seus valores e tradições de que tanto nos orgulhamos ao domínio de potências estrangeiras, buscando reduzir o Brasil à condição inferior e degradante de uma simples colônia”. Pontaria certeira, mestre Celso de Mello. Bravo!

MAIS DO QUE NECESSÁRIA, a epístola de Mello (o Celso) devolve à razão o sentido patriótico. Em função do bolsonarismo doentio, a palavra “patriota” foi degenerada numa prática exibicionista de ódio, covardia, golpismo – e, patética contradição, passou a ser usada como biombo para um entreguismo exacerbado. O patriotarismo (neologismo acertado) bolsonarista nada mais é que a abjeta traição à pátria, a desmoralização do verde-amarelo que outrara era referência da unidade e orgulho nacional. Muito antes do entreguista Dudu Bananinha chafurdar na lama da Casa Branca, seu pai e mentor, o famigerado “mito” já se esmerava em bater continência para a bandeira estadunidense e em babar pegajosos “eu te amo...” para Donald Trump.

CELSO DE MELLO , em sua carta histórica, recupera o conteúdo de palavras antes esquecidas, aviltadas ou invertidas: Traidor da pátria é traidor da pátria. Sórdido é sórdido. Covarde é covarde. Mendaz é quem só diz mentiras. E “os 'quislings' nacionais que, ressentidos, despojados de qualquer dignidade e destituídos de qualquer sentimento patriótico de respeito e apreço por nosso país” são esses milicianos que, para dar fuga a um réu e assaltar a Democracia à mão armada, ficam de quatro para a primeira potência estrangeira que se dispõe a violento a autonomia brasileira.

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Leia também: Para além do “economicismo governamental” https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/minha-opiniao_5.html 

A essência do Pix

Por que Trump teme o Pix
Nobel da Economia explica: sistema brasileiro é rápido, seguro e gratuito – por isso, tornou-se popular. Seus “problemas”: ele quebra o mito do Estado “ineficiente”, ameaça lucros financeiros parasitários e pode tornar obsoletos os bancos privados
Paul Krugman | Tradução: Antonio Martins/Outras Palavras  

Na semana passada, a Câmara dos Deputados dos EUA aprovou a Lei Genius, que impulsionará o crescimento das stablecoins, [moedas digitais privadas, atreladas ao dólar] abrindo caminho para futuros golpes e crises financeiras. Na quinta-feira, os deputados norte-americanos também aprovaram um projeto que proíbe o Federal Reserve (Fed, banco central) de criar uma moeda digital pública (Central Bank Digital Currency, ou CBDC) — ou mesmo de estudar a ideia. 

Por que o Partido Republicano de Trump tem tanto medo de uma CBDC a ponto de literalmente ordenar que o Fed nem pense no assunto?Em 2022, o Fed emitiu um relatório preliminar sobre a possibilidade de criar uma CBDC, descrita como “análoga a uma versão digital do papel-moeda”. Atualmente, os norte-americanos só podem usar um tipo de passivo do Federal Reserve: pedaços de papel verde com rostos de presidentes mortos. Uma CBDC ampliaria esse direito, permitindo depósitos diretos no Fed na forma de registros digitais — como, aliás, são todos os depósitos bancários hoje. 

Se isso soa estranho, lembre-se que já temos algo equivalente a uma moeda digital de banco central (CBDC) — mas só para instituições financeiras. Os bancos têm contas no Fed e transferem recursos entre si via sistemas eletrônicos. Por que não estender esse acesso a pessoas e empresas não financeiras?

Os parlamentares do Partido Republicano alegam preocupação com privacidade, dizendo que uma CBDC permitiria vigilância estatal generalizada. Mas são os mesmos que repassaram dados do Medicaid à polícia de imigração (ICE), para facilitar prisões e deportações. Se você acredita que sua motivação é proteger cidadãos, tenho umas moedas digitais da família Trump para vender…

Vale lembrar: o Estado já pode acessar registros bancários privados em certas circunstâncias e tem, por certo, tecnologia para rastrear cada transação financeira que você faça. O que o impede é a lei — no caso norte-americano, a Lei do Direito à Privacidade Financeira [Right to Financial Privacy Act]. Uma CBDC teria proteções similares. Ou você confia no Estado de Direito, ou não.

O verdadeiro que os republicanos têm (e com razão) é que muitos prefiram uma CBDC a bancos privados — principalmente, mas não só, no lugar das stablecoins. Qualquer tentativa de criar uma moeda digital completamente estatal enfrentaria feroz oposição do setor financeiro.

Mas e a hipótese de uma CBDC parcial? Será que poderíamos manter contas em bancos privados, mas contar com um sistema público eficiente para fazer ou receber pagamentos a partir destas contas?

Sim, poderíamos. Sabemos disso porque o Brasil já fez.

A maioria das pessoas provavelmente não vê o Brasil como líder em inovação financeira, mas sua economia política é bem diferente da norte-americana. Lá, ex-presidentes que tentam melar eleições vão para a cadeia. E os lobbies que travam uma moeda digital nos EUA têm menos força por lá. O Brasil planeja até uma CBDC, mas o primeiro passo foi o Pix, sistema de pagamentos do Banco Central lançado em 2020.

O Pix é como uma versão pública do Zelle (o sistema de pagamentos operado, nos EUA, por um consórcio de bancos privados), mas muito mais fácil de usar. O Zelle é grande, mas o Pix é imenso: 93% dos adultos brasileiros o usam. E parece estar substituindo rapidamente tanto o dinheiro quanto os cartões, como mostra o gráfico abaixo:

E por quê? Segundo o FMI, pelos seguintes motivos:

· As transações no Pix são quase instantâneas (levam 3 segundos, contra 2 dias no cartão de débito e 28 no cartão crédito).
· Os custos são baixos. O sistema é gratuito para pessoas físicas e cobra apenas 0,33% do valor transferido para empresas (contra 1,13% no cartão de débito e 2,34% no de crédito).

O Pix faz o que os entusiastas das criptomoedas prometeram (e não cumpriram): baixo custo e inclusão financeira. Compare os 93% de brasileiros que usam o Pix com os míseros 2% de norte-americanos – sim, apenas 2%! – que usaram criptomoedas para pagar algo ou fazer algum tipo de pagamento em 2024.

Teremos algo como o Pix nos EUA? Não. Ou só daqui muito tempo, por dois motivos.

Primeiro, o setor financeiro dos EUA é poderoso demais e jamais permitiria um sistema público competindo com seus produtos — ainda que (ou justamente porque) fosse melhor. A gestão Trump já sugeriu que o Pix no Brasil é “concorrência desleal” para as bandeiras norte-americanas de cartões.

Segundo, a direita norte-americana crê piamente que o Estado é sempre o problema, nunca a solução. Os republicanos jamais admitiriam que um sistema público de pagamentos possa ser melhor que as alternativas do setor privado.

Outros países poderão aprender com o sucesso do Brasil e desenvolver um sistema de pagamentos digital. Mas é muito provável que os EUA sigam reféns de uma combinação entre interesses corporativos e fantasias cripto.

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Por que Trump teme o sistema monetário do BRICS https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/o-que-tira-o-sono-de-trump.html 

Sylvio: prejuízo

A aplicação de tributação em 50% decretada por Trump para nossos produtos traz impactos negativos para Pernambuco. O que encontra os bolsonaristas locais e, particularmente, o sanfoneiro Gilson Machado, pretenso candidato a senador?

Sílvio Belém 

Um mito norte-americano: “A maior democracia do mundo”  https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/enio-lins-opina_24.html 

28 julho 2025

Minha opinião

Fora das quatro linhas

Luciano Siqueira 
instagram.com/lucianosiqueira65

O clã Bolsonaro, por enquanto ainda proeminente na extrema direita brasileira, coleciona a investigações criminais e processos judiciais em razão de um erro primário: substitui a defesa de ideias por atitudes inadequadas.

O capitão reformado Jair fez isso de modo indiscriminado no exercício da presidência. Inclusive atacando nominalmente autoridades constituídas, a exemplo de um dos seus alvos principais o ministro da suprema corte Alexandre de Moraes. 

Agora paga muito caro. 

O filho deputado federal auto exilado nos Estados Unidos, idem. 

Luta política em termos elevados, jamais; provocações de baixo nível, sim.

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Leia também: Para além do “economicismo governamental” https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/minha-opiniao_5.html 

Palavra de poeta

Soneto da separação
Vinícius de Moraes 

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

[Ilustração: Robert Reid]

Leia também: Graciliano Ramos e o texto no tempo das redes https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/06/expoente-da-literatura-brasileira.html 

Postei nas redes

Nas redes digitais, a extrema direita aumenta sua torcida em favor de Trump contra o STF e o Brasil. Uma mistura de neofascismo com "universo paralelo". 

A Revolução Brasileira no século XXI https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/walter-sorrentino-opina_22.html

Fotografia

Luciano Siqueira